Estudos de Literatura e Cinema


Os ECLLP é nosso ponto de partida para a especialização no ramo de Estudos de Literatura e Cinema, articulando, na medida do possível, pontos de vista semiológico, narratológico e estrutural sobre as duas artes. Se por um lado, é para nós importante fazer exercícios de análise triangular comparativa, quer a nível do método quer a nível do objeto, esperamos progredir no sentido de encontrar a nossa própria forma de pensar e analisar literatura e cinema.

Diferentemente dos temas que viemos tratando até agora nesse percurso básico-fundamental, este tema ainda não conta com um manual de introdução largamente aceito e que apresente e/ou problematize as questões que os pesquisadores do nosso meio vêm procurando responder. Até porque nosso Grupo de Estudos de Literatura e Cinema do ECLLP é bastante recente. Composto pelas professoras Fabiana Carelli, Aparecida de Fátima Bueno e Maria Zilda da Cunha e parte de seus orientandos, o Grupo iniciou suas atividades em 2008, promovendo encontros e um colóquio entre pesquisadores do ramo.

Dedicaremos uma sessão às referências bibliográficas deste ramo de pesquisa, que aos poucos irá trazendo seus preceitos básicos e questões características. Partiremos dos trabalhos mais próximos a nós, ou seja, livros e artigos escritos por professores que conhecemos, e penetraremos aos poucos nas obras canônicas. Antes disso, porém, adiantemos a discussão a fim de delimitar o terreno.

A comparação entre literatura e cinema executada através da ótica da adaptação foi o ponto de partida dos Estudos de Literatura e Cinema, galho da árvore da área de Literatura e Outras Artes, por sua vez pertencente à floresta espessa que é a Literatura Comparada. O fenômeno da transposição audiovisual de textos literários é tão antigo quanto o cinema, que desde cedo levou para a tela tanto os grandes clássicos como textos literários recentes.  Inevitável, por isso, que a recepção desses filmes procurasse compará-los com os respectivos textos-fonte, examinando-os a partir do critério da fidelidade. Mas se o espectador-leitor valoriza o filme de acordo com as semelhanças e diferenças junto ao livro, ou junto a sua leitura do livro, o pesquisador dos estudos de literatura e cinema vale-se do conceito de (in)fidelidade para discutir a multiplicidade de leituras possíveis e válidas de uma obra literária, procurando explicitar a leitura específica que foi apresentada no filme.

Não é aleatória a proliferação de adaptações de livros em filmes ou de filmes em livros. A literatura e o cinema, enquanto obras de arte, possuem entre si uma relação muito mais forte do que a que mantêm com as demais artes. Isso porque ambas são temporais e, portanto, narrativas. Narrativas no sentido do suceder temporal de situações, não necessariamente construídas (contadas) de forma realística ou lógica, mas apreendidas e entendidas conforme vão sendo apresentadas no decorrer dessa construção (narração). E porque ambas são artes narrativas, cinema e literatura podem ser aproximados de várias formas, não apenas na análise comparada entre uma obra adaptada e sua adaptação. Aliás, muitas das ferramentas de análise dos estudos de cinema têm origem nos estudos literários. A própria condução da câmera na criação do assunto do filme é estudada com base nos estudos sobre o narrador. Assim como é a mente, a moral e as palavras do narrador que circunscrevem o universo narrado num texto literário, é a câmera que estabelece o ponto de vista, o recorte do mundo e a forma imagética que delimitam o universo mostrado num texto fílmico.

Por isso, as técnicas discursivas da criação literária e da criação cinematográfica têm vários pontos de encontro. Animanos com esses pontos de intersecção, alguns críticos desenvolveram, entre 1940 a 60, um movimento em torno do cinema avant la lettre, do cinema antes do cinema, no intuito de mapear na literatura do passado embriões da linguagem cinematográfica desenvolvida no século XX. Eles vasculhavam os clássicos buscando neles o que poderia haver de cinematográfico. Técnicas que atribuímos ao cinema, como o cluse up e a visão panorâmica, serviram e continuam servindo à literatura, seja em prosa ou em verso, não porque esses autores tiveram uma intuição visionária, mas porque, tanto o cinema como a literatura trabalham com imagens visualizáveis que se sucedem temporalmente.

As questõ es que apresentei aqui vêm de reflexões próprias, mas são devedoras do verbete sobre os Estudos de Literatura e Cinema do e-Dicionário e de dois professores portugueses que conheço cujos trabalhos tenho acompanhado há algum tempo, Maria do Rosário Lupi Bello e Sérgio Guimarães de Sousa.


Indicação bibliográfica:
BELLO, Maria do Rosário Lupi. Da imagem literária à imagem cinematográfica: o ‘concreto’ e o ‘icônico’ como vocação narrativa. In: V Congresso da APLC - Associação Portuguesa de Literatura Comparada. Lisboa: Universidade Aberta, 2004.
SOUSA, Sérgio Guimarães de. Breve apontamento sobre o cinema avant la lettre. In: OLIVEIRA, Anabela Dinis Branco de; MOREIRA, Fernando Alberto Torres; SANTOS, Idelette Muzart-Fonseca dos Santos; ESTEVES, José Manuel da Costa (orgs.). Diálogos lusófonos: literatura e cinema. Literatura, cinema e multiculturalismo no mundo lusófono 2006-2007. Coleção Cultura 1. Centro de Estudos em Letras, Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro e Cátedra Lindley Cintra, Universidade Paris Ouest-Nanterre La Défense. Vila Real: MMVIII, 2008.